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Chemsex e prazer

  • Foto do escritor: Lucas Liberato
    Lucas Liberato
  • há 3 dias
  • 7 min de leitura

Atualizado: há 2 dias

Perguntas frequentes entre homens que fazem sexo com homens

Este texto reúne perguntas que chegam até mim com muita frequência, especialmente de homens que fazem sexo com homens e que vivem experiências de sexo prolongado, com múltiplos parceiros e, em alguns casos, com uso de substâncias. São perguntas que raramente aparecem formuladas de maneira organizada, mas que circulam em mensagens privadas, em atendimentos clínicos, em relatos fragmentados e, muitas vezes, em silêncio.

Muitas dessas dúvidas surgem depois de experiências intensas de chemsex. Outras aparecem quando alguém começa a se perguntar por que o sexo sem drogas parece diferente, por que o desejo mudou, por que a excitação funciona de outro jeito, ou por que o prazer vivido durante a experiência não se sustenta emocionalmente depois. Não são perguntas “técnicas”, no sentido estrito. São perguntas existenciais, corporais e afetivas, feitas por pessoas que estão tentando entender o que está acontecendo consigo mesmas.

O que atravessa todas elas é uma tentativa de dar sentido à própria experiência sexual, sem moralismo, sem patologização automática e sem respostas simplistas. Aqui, não parto da ideia de que existe uma forma certa ou errada de viver o sexo, nem de que o uso de substâncias, por si só, define um problema. O que me interessa é compreender como essas experiências impactam o corpo, o prazer, o desejo, a relação consigo e com o outro.

As perguntas refletem inquietações reais, formuladas do jeito que costumam aparecer: diretas, às vezes confusas, carregadas de medo, curiosidade ou frustração. As respostas não são receitas nem promessas de solução rápida. São convites à compreensão, à escuta do corpo e à construção de uma relação menos violenta e mais honesta com a própria sexualidade.

Se você se reconhecer em alguma delas, saiba que isso indica que algo em você está tentando entender, integrar e cuidar da própria experiência. E esse é um movimento muito importante.



Depois de fazer chemsex, o sexo sem drogas parece fraco ou sem graça. Isso é normal?

Sim. O uso repetido de substâncias em contextos sexuais tende a elevar o limiar de excitação (ou seja, o corpo passa a precisar de estímulos mais intensos para atingir níveis semelhantes de excitação). Quando isso acontece, o sexo sem uso de substâncias pode parecer lento, pouco estimulante ou insuficiente em comparação.

O tesão induzido por substâncias costuma ser intenso, imediato e insistente. O prazer, por outro lado, depende de integração corporal, tempo e alguma possibilidade de entrega. Quando a experiência sexual passa a se organizar quase exclusivamente em torno da intensidade, o corpo aprende a associar prazer apenas a estados extremos.

Com o tempo, experiências sexuais menos aceleradas podem parecer fracas ou sem graça, mesmo quando são potencialmente prazerosas. Não porque falte desejo, mas porque a régua interna foi deslocada. Essa confusão entre intensidade e prazer costuma gerar frustração e autocrítica, quando na verdade revela um processo de adaptação do corpo.


Depois do chemsex, sinto que preciso de estímulos cada vez mais fortes para sentir tesão. Isso é normal?

O tesão induzido por substâncias costuma ser intenso, imediato e insistente. O prazer, por outro lado, depende de integração corporal, tempo e alguma possibilidade de entrega. Quando a experiência sexual passa a se organizar quase exclusivamente em torno da intensidade, o corpo aprende a associar prazer apenas a estados extremos.

Com o tempo, experiências sexuais menos aceleradas podem parecer fracas ou sem graça, mesmo quando são potencialmente prazerosas. Não porque falte desejo, mas porque a régua interna foi deslocada. Essa confusão entre intensidade e prazer costuma gerar muita frustração e autocrítica, quando na verdade revela um processo de adaptação do corpo.


Meu desejo sexual só aparece quando uso drogas. Isso quer dizer que perdi o desejo espontâneo?

Na maioria dos casos, não. O que costuma acontecer é que o desejo fica condicionado ao contexto químico. O corpo aprende que aquele é o ambiente onde há menos inibição, menos vergonha, menos medo de falhar e mais previsibilidade.

Além disso, diversas substâncias aumentam o desejo sexual por um período de tempo. Quando o efeito passa, muitas pessoas estranham o tesão “no pelo”, sem estímulo químico, e interpretam isso como perda de desejo, quando muitas vezes se trata de comparação com um estado artificialmente intensificado.

Fora desse contexto, o desejo pode até existir, mas vem acompanhado de ansiedade, comparação ou autocobrança. Esses fatores interrompem a excitação antes mesmo que ela tenha espaço para se desenvolver. O desejo não desapareceu, ficou associado a um cenário específico.

Pode ser que, temporariamente, o sexo “careta” perca a atração pra você, mas o corpo tem muitas estações e as coisas mudam. Se você se cuidar, o seu corpo, que se acostumou a funcionar em um regime de alta intensidade, vai recuperar a sua voz.


Por que me sinto mais solto, confiante ou à vontade sexualmente quando uso substâncias?

Para muitas pessoas, as substâncias reduzem temporariamente estados emocionais difíceis de sustentar no sexo, como vergonha, insegurança corporal, medo de rejeição ou ansiedade de desempenho. O corpo relaxa e se desinibe não porque esses conflitos se resolvem, mas porque ficam momentaneamente amortecidos pelo efeito psicoativo das substâncias.

Muitas vezes, esse efeito é um grande motivador da repetição cada vez maior do uso, o que sabemos, pode levar a uma dependência. Quando esse amortecimento passa a ser a única forma possível de se sentir à vontade sexualmente, o corpo aprende que o sexo só é seguro ou possível sob certas condições extremas, o que tende a aumentar a dependência do contexto de chemsex e do uso de substâncias.


O chemsex pode mudar de forma duradoura minha relação com o prazer e com o sexo?

O uso de substâncias em contextos sexuais inevitavelmente produz mudanças. O corpo se adapta às experiências que vive, especialmente quando elas são intensas e repetidas. A pergunta clínica importante não costuma ser se houve mudança, mas em que direção essa mudança está acontecendo.

Muitas pessoas percebem que, com o tempo, sua relação com o prazer, com o corpo e com o sexo vai se transformando. Nem sempre de forma clara ou consciente. Essas mudanças costumam aparecer na terapia, quando experiências, estados emocionais e conflitos começam a ser elaborados em palavras.

Esse processo pode ajudar a compreender como a sexualidade está sendo vivida hoje e se há desejo de seguir nessa direção ou de reconstruir uma relação mais ampla com o prazer, menos dependente de aceleração química. Quando esse desejo de mudar aparece, ele costuma pedir tempo, escuta e, muitas vezes, acompanhamento profissional.


Por que fico frustrado depois do chemsex, mesmo tendo curtido durante a experiência?

Muitos homens relatam que, durante o sexo químico, tudo parece bom, intenso, às vezes até incrível. Mas, quando acaba, algo se perde. Fica um vazio difícil de nomear, uma sensação de que aquilo não se sustentou como se imaginava.

Há vários fatores que podem contribuir para essa sensação. O chamado “rebote” de algumas substâncias, inclusive do álcool, é um deles. Além disso, surgem sentimentos de culpa, vergonha ou arrependimento, frequentemente ligados a anos de socialização marcada por homofobia internalizada e discursos morais sobre o sexo entre homens.

Também entram em jogo expectativas de vínculo, afeto ou reconhecimento que pouco encontram espaço nesses encontros. Quando esses elementos se acumulam, o prazer vivido durante o sexo não se transforma em satisfação emocional depois.

Reconstruir a relação com a sexualidade passa por olhar para tudo isso com cuidado, sem pressa e sem violência consigo mesmo. Aprender a escutar o próprio corpo, reconhecer limites e desejos e reduzir culpa e medo abre espaço para experiências sexuais menos ameaçadoras e mais vivas.


É possível reaprender a sentir prazer sem tanta intensidade, depois do chemsex?

Sim, é possível. Mas esse processo costuma levar tempo. Reaprender o próprio prazer envolve desacelerar, viver as sensações menos intensas no início com suavidade e reconstruir segurança corporal e emocional durante o sexo.

Uma atitude de curiosidade em relação à própria sexualidade costuma ajudar muito. Observar como o corpo responde, o que excita, o que afasta, o que gera medo ou relaxamento permite acessar informações importantes sobre si mesmo. Esse contato gradual tende a reconectar sua percepção do seu corpo.


Quando vale procurar ajuda profissional por questões de prazer e chemsex?

Não há uma hora “certa”. A hora que você pensou em pedir ajuda, é a hora. A hora que você conseguir pedir ajuda, é a hora. Quando você sente que não está mais dando conta, que sua conexão com sua vida está frágil, que você quer algo diferente pra você… Estamos aqui. Vamos juntos?



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Este é um FAQ vivo. As perguntas reunidas aqui continuam chegando, mudando de forma e ganhando novos contornos conforme as experiências, os contextos e as histórias se transformam. Este espaço seguirá sendo atualizado para acolher essas inquietações com cuidado, escuta e responsabilidade clínica, sempre a partir do que realmente aparece na vida das pessoas que chegam até a clínica.

 
 
 

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