Crescer nunca para de doer

Acordando de um sono conturbado depois de um episódio de dumping que durou horas, eu me vi espantado com a minha própria humanidade, um momento de vulnerabilidade que me pegou de surpresa.

Mesmo com 3 anos desse processo de mudanças no estilo de vida e no meu peso, a fragilidade ainda é uma surpresa pra mim.

Mas embora eu tenha ganhado uma nova vida, um novo corpo e muitas coisas boas em troca, por vezes ainda me pego lidando com uma fragilidade que continua me pegando quase desprevinido, despreparado para lidar com minha própria humanidade.

Eu me transformei por dentro e por fora

Eu evito falar sobre porque é muito difícil falar sobre as dores que ainda passamos.

Quero mostrar que sentir nunca vai deixar de ser presente. Momentos difíceis não deixam de existir.

E eles significam vida, movimento, continuar é a linguagem da vida.

Eu passei por uma cirurgia bariátrica cerca de dois anos atrás, em que tive meu estômago reduzido a cerca de 150ml de capacidade máxima. Para que você tenha uma ideia, um estômago adulto normalmente pode ser expandir até cerca de 4 litros.

Ainda hoje, me alimento muito menos que seria esperado para um homem do meu tamanho.

A cirurgia me trouxe inúmeros ganhos e eu recomendo muito.

Mas eu tive a má sorte de ser a pessoa mais suscetível do mundo à Síndrome de Dumping.

A chamada Síndrome de Dumping ocorre a quem teve o funcionamento digestivo alterado pela bariátrica, quando os alimentos ricos em açúcar, carboidratos refinados e gorduras (praticamente tudo), passam muito rápido para o intestino.

Os sintomas vão desde enjoos e sudorese, até sensação de desmaio. Se você convive comigo mais frequentemente, já me viu me ausentar repentinamente pra deitar um pouco. Esse um pouco pode ser até o fim do rolê.

Se for um episódio mais forte, eu preciso inclusive dormir.

Por isso, eu acabo postergando comer, já que realmente não dá pra saber o que vai me causar um episódio de dumping que as vezes me deixa nocauteado, me sentindo fraco e indisposto por 2, até 3 horas.

Mesmo alimentos que costumam ser "seguros" às vezes me dão dumping. Posso ter comido mais rápido, sem tanto cuidado ou apenas algo diferente no meu corpo aquele dia e pronto, um dumping inesperado.

É difícil manter uma alimentação saudável com esse problema. E comer pouco afeta minha disposição, que é diretamente proporcional a qualidade da minha alimentação e meu sono. Afeta meu humor, meu senso de bem-estar mesmo.

Quando eu não ligava pra nada disso, até uns anos atrás, eu não conseguia perceber conscientemente o impacto da alimentação, por exemplo, no meu dia-a-dia. Talvez porque eu coma tão menos hoje, e também porque penso tanto nisso, percebo diretamente.

Compartilho isso porque... Não sei bem. Ser vulnerável não acontece naturalmente pra mim.

Eu evito sempre que posso, instintivamente.

Eu tenho me lembrado com frequência de como somos frágeis, de como crescer nunca para de ser difícil e nunca para de doer.

Mas pra mim é importante exercitar isso, compartilhar a verdade que sustenta as coisas que eu falo e faço.

Eu preciso exercitar todos os dias, assim como todo mundo, pensar com mais gentileza e flexibilidade. Quando deixamos solto, a mente se polariza, fica ainda mais difícil olhar pras experiências sem classificá-las como boas x ruins, bonitas x feias, úteis x inúteis, perda de tempo x (já nem sei mais qual é o oposto disso).

Sem colocar uma etiqueta mental em tudo.

Se lembramos de como tudo está sempre passageiro, é menos difícil prestar atenção no presente sem colocar uma etiqueta em cada aspecto dele.

Um dia de cada vez eu sigo.

Um tempo atrás em um dia como esse, eu acharia que tudo está perdido.

Hoje eu olho com doçura pra mim e me abraço.

Olha o quanto você já caminhou, gata.

Olha quanta coragem a senhora tem.

A vida é dura, mas a senhora é macia e hidratada, sempre. Cada dia melhor, o tempo só te valoriza.

Como assim, desistir? Jamais. Sofra hoje, levante amanhã!

A matéria desse corpinho de 1,85m se lembra de explosões cósmicas e surgimento do universo, meu amor.

Nada a temer.

(Sim, eu falo comigo mesmo assim na minha cabeça. )

É se pegar pela mão, se dar um abraço e se ajudar a fazer.

Todos os dias, pra sempre. Sempre vai ser necessário se ajudar.

Me ajuda a ter em mente que qualquer processo tem seus momentos de leveza, alegria e orgulho mas também tem dores, fragilidades e perdas.

Não existe mudança - e nem vida - sem perda.

Eu estou bem e vou ficar cada vez melhor.

Li em algum lugar que uma grande verdade sobre o hoje, é que não importa como tenha sido, nunca mais precisaremos viver esse dia de novo.

Leia de novo.

E lembre!

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